Na quarta edição do webinar Incorpod, especialistas debateram o uso do BIM no mercado de construção e os desafios para sua adoção
O potencial da adoção do BIM (Building Information Modeling) na construção civil é imenso. Alguns estudos apontam que esse processo pode reduzir o gasto total da obra em cerca de 10%. Além disso, estima-se que pode contribuir para elevar a produtividade também em torno de 10%.
Contudo, assim como qualquer inovação, a adoção do BIM enfrenta grandes desafios. A complexidade dos processos de construção e as barreiras para mudanças estruturais que fazem parte da cultura do setor estão entre os principais.
Porém, mesmo com esses obstáculos, o BIM vem sendo cada vez mais utilizado na construção brasileira, adaptando-se à maturidade e às necessidades específicas das empresas.
Esse foi justamente o tema da quarta edição do Incorpod, webinar realizado pela Celere para debater temas relevantes para construtoras e incorporadoras que desejam se manter atualizadas e alinhadas ao mercado.
Durante o encontro, Raphael Chelin, CEO da Celere, conversou com Flávio Graziano, sócio-diretor da Tools Gerenciamento e Engenharia, sobre como o BIM vem evoluindo na construção brasileira e se ajustando para atender às particularidades do setor.
Acompanhe os destaques dessa conversa.
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O BIM e as informações fundamentais para a gestão de obras eficiente
Segundo Raphael Chelin, é possível dividir os dados para a gestão dos projetos de construção em três áreas principais:
- Projetos
- Pré-obra
- Obra
“Realizar uma obra com o menor custo possível requer uma gestão profissional e um gerenciamento de obras organizado. Para alcançar esse objetivo, é crucial contar com projetos de qualidade desde o início, que sejam compatibilizados e tragam informações essenciais. Esses dados serão utilizados para conduzir todos os processos da obra: pré-orçamento, planejamento, compras, contratações e demais etapas”, detalha.
Ele explica que, em um mundo ideal, todas as informações viriam de uma só fonte. No entanto, essa prática ainda é rara no mercado.
Ele conta que é comum, por exemplo, que a informação presente no projeto não coincida necessariamente com a do orçamento. A grande diversidade de profissionais, áreas e empresas envolvidas em um projeto de construção dificulta a comunicação.
“Com base em nossa experiência, observamos que, quando não há coordenação e compatibilização adequadas nos projetos, há lacunas nas informações. Portanto, o ideal é estabelecer uma conexão entre os projetos, a fase pré-obra e a obra. Essa abordagem é essencial para garantir a integração das informações e áreas. Ou seja, é preciso desenvolver um processo no qual os dados (informações) sejam sempre reutilizados ou complementados, visando otimizar a gestão e a eficiência do projeto”, ressalta o CEO da Celere.
O especialista destaca que a premissa do BIM é exatamente essa: ajudar a centralizar as informações. Assim, todos os envolvidos estão alinhados em todas as fases do projeto.
Abaixo, apresentamos o framework que representa o que prega o uso do BIM, em que todas as informações estão conectadas em um único modelo. “É a ideia de utilização de um modelo único colaborativo”, explica Raphael.
A evolução do BIM no mercado
Durante o Incorpod, Flávio Graziano falou muito sobre a evolução da adoção do BIM no Brasil nos últimos 15 anos.
De acordo com o executivo da Tools, inicialmente, o BIM entrou no setor brasileiro somente na etapa de projetos (BIM 3D), sendo gradualmente utilizado para o cronograma de obras (BIM 4D).
Ao longo desse tempo, Flávio relembra que surgiram alguns usos do BIM para orçamentação, todos fundamentados na ideia de ter um modelo único que nasce no projeto e evolui à medida que ele avança, gerando diversas saídas para as especialidades dentro do ciclo de construção.
Atualmente, ele percebe que há um amadurecimento desse processo, com a orçamentação (BIM 5D) ganhando mais destaque, enquanto o uso do BIM 4D vem perdendo força.
Nesse contexto, Flávio indica que houve uma evolução do uso do BIM na construção, com vários modelos sendo trabalhados paralelamente e de forma complementar – ao invés de um modelo único central.
“Chegamos à conclusão de que é possível ter vários modelos ao longo do ciclo de construção, permitindo diversos usos do BIM para atender às diferentes necessidades, em diferentes fases. Esses modelos podem evoluir de forma paralela ou independente, não sendo estritamente necessário aderir à ideia do modelo único, conforme a teoria padrão do BIM”, aponta.
O BIM 5D na construção
Sobre o uso do BIM para o orçamento de obras, Raphael esclarece que o BIM 5D tem ganhado cada vez mais força no mercado de construção. Afinal, ele promove melhorias e proporciona ganhos reais de produtividade para diferentes áreas e etapas do negócio.
O especialista explica que utiliza-se o BIM 5D na fase conceitual do projeto para fornecer informações essenciais para a orçamentação.
Durante a fase de desenvolvimento do projeto arquitetônico (produto), o incorporador precisa dessas informações para ajustar a tabela de vendas e avaliar a viabilidade do custo. Essas informações são cruciais para garantir que o empreendimento seja financeiramente viável.
Nessa fase, as informações do projeto são utilizadas não só para gerar um orçamento executivo – que se torna a base para a meta de construção –, como também para gerar a base das informações para todo o controle de obra (desde o planejamento, até o controle de execução, medição e qualidade).
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O BIM na construção: teoria e realidade
O CEO da Celere salienta que, no caso da adoção do BIM no Brasil, ‘a realidade vem esmagando a teoria’. Ele ressalta que ainda que a teoria seja fundamental, é importante que ela coexista com a prática.
“Não adianta ter uma teoria que não seja adequada à realidade. As incorporadoras e construtoras muitas vezes não seguem a teoria BIM ‘by the book’ não porque não querem, mas porque a realidade é muito diferente. Precisamos adaptar essa teoria à realidade”, reforça.
De acordo com os especialistas que participaram do Incorpod 4, existem alguns aspectos da realidade do setor de construção que impedem a utilização da teoria do BIM (especialmente no que diz respeito ao modelo único) na prática. São eles:
1) Obras que iniciam sem todos os projetos
Raphael comenta que uma das questões que impactam os processos de construção e dificultam a adoção do modelo único no BIM é a necessidade de equilibrar prazos de lançamento com o desenvolvimento do projeto.
Por exemplo, algumas empresas adiam o desenvolvimento dos projetos complementares, preferindo começar a desenvolvê-los apenas após vender algumas unidades.
Além disso, iniciar a obra antes pode atrair compradores potenciais e acelerar as vendas das unidades. Porém, isso entra em conflito com a necessidade de ter projetos completos para um orçamento preciso.
“Então, a obra tem que começar antes, o projeto tem que começar depois, mas para começar a obra precisa do orçamento. O que vai acontecer? Há uma grande chance de esse orçamento não vir do modelo – afinal, se não há projeto finalizado, não há informação para levantar as quantidades.
Ou seja, essa realidade acaba fazendo com que as empresas busquem alternativas. Assim, elas acabam usando um modelo para compatibilizar projeto e depois geram outro modelo para desenvolver um orçamento e o planejamento”, conta o CEO da Celere.
2) Foco dos projetistas em documentação
Flávio ressalta que a ênfase dos projetistas na documentação é outro fator que influencia a forma como o BIM é adotado.
Ele conta que é comum que haja um excesso de preocupação dos projetistas em criar modelos visualmente atraentes, com geometria elaborada, enquanto a necessidade real está na obtenção de informações detalhadas. Por exemplo, ao examinar as instalações em um modelo, é comum encontrar falta de informações, como especificações de equipamentos.
“Como podemos incentivar os projetistas a fornecer mais dados e aprimorar seus processos de modelagem? Nossa abordagem tem sido estabelecer padrões rigorosos na fase de projeto. Assim, garantimos que essas informações sejam complementadas, permitindo uma melhor utilização do BIM para fins de orçamentação”, detalha.
3) Falta de orçamento preciso no início da obra
O diretor da Tools também indica que outra realidade importante do mercado de construção é o fato de que muitas obras começam sem ter um orçamento preciso. Isso, novamente, vai contra a teoria do modelo único.
“Frequentemente, há um grande intervalo entre um orçamento de viabilidade e um orçamento executivo. As incorporadoras e contratantes muitas vezes operam às cegas, até que um orçamento executivo seja desenvolvido durante o processo de licitação da construtora.
Esse processo pode levar até um ano, e quando os orçamentos são finalmente recebidos, os desvios em relação aos custos iniciais podem ser significativos, chegando a 30 ou 40%. É desafiador garantir que os projetos permaneçam dentro das margens de viabilidade”, indica.
4) Crescente terceirização das equipes
Levando em conta que muitas construtoras e incorporadores não têm equipe suficiente, Flávio comenta que há uma tendência de terceirização no setor de construção. Nesse contexto, a adoção do modelo único do BIM se torna um desafio muito grande.
“Vemos hoje, na maioria dos casos, o incorporador puro concebendo um produto, focando no sucesso desse empreendimento, e todas as outras especialidades sendo terceirizadas – planejamento, custo construção etc. Então, como juntar todas essas caixinhas dentro de um processo de trabalho através dos usos do BIM é o grande desafio do mercado”, aponta.
5) Falta de processos estabelecidos
Por fim, o executivo da Tools aponta que uma das principais deficiências do mercado de construção que impedem a aplicação da teoria de modelo único do BIM é a falta de processos padronizados.
Segundo Flávio, essa falta de processos estabelecidos é o que faz com que, por exemplo, muitas obras iniciem sem um prazo claro, o que comprime o tempo para o desenvolvimento de projetos.
“Para aproveitar ao máximo o BIM, é essencial que os projetos sejam modelados com qualidade e detalhes suficientes. No entanto, a falta de prazos adequados torna difícil garantir a qualidade dos modelos, e muitas vezes o BIM é relegado a segundo plano em contratos com prazos apertados. Isso prejudica o uso eficaz do BIM para mitigar riscos e afeta negativamente todas as etapas do projeto”, salienta.
Como, então, adaptar os processos BIM para se adaptar à realidade das empresas de construção?
Esse é o tema do próximo artigo de cobertura do Incorpod 4. Nele, vamos mostrar como a Celere e a Tools ajudam as construtoras e incorporadoras a adotar o BIM de maneira prática, alinhando às suas necessidades específicas.